Embarquei no CL- Barroso- C11, em
fevereiro de 1959 logo que concluí o
curso de ESP/MO no CIAW, e desembarquei em fevereiro de 1962. Foram três anos de aprendizado e de muito orgulho de ter sido
membro da guarnição de um dos navios mais famosos da marinha brasileira de
todos os tempos. O navio com 185 metros de proa a popa era de uma beleza
indescritível. O seu armamento no convés principal encimado pelas cinco torres
tripleces de 152 milímetros detinha um poder de fogo fantástico. Na máquina do
navio tudo era impressionante. Três praças de caldeiras de vapor saturado e uma
praça de vapor superaquecido, a Bravo-4. Duas praças de Máquinas, Charlie –I e
Charlie –II onde ficavam os turbos geradores principais e oito turbinas de alta
e baixa pressão totalizando 100.000 HP de potência nos quatro eixos. O navio
era uma verdadeira cidade flutuante. No compartimento de lazer, a lapa, a guarnição se concentrava após
refeições, postos de combate ou cerimônias religiosas onde existia uma capela.
O valoroso barco contava com as seguintes comodidades: lavanderia, alfaiataria,
sapataria; barbearia, padaria correios e cinema que funcionava na lapa ou no convés principal.
Passagens Relevantes
01- 1959 - A minha
primeira comissão no CL Barroso foi
ao porto do Rio Grande, RS. Nessa viagem o navio encalhou na saída da barra o que
originou uma grande correria a bordo principalmente na praça de máquinas, Charlie II, com a entrada de areia no condensador
de água doce. O navio assentado no fundo por ter um grande calado ficou
adernado no canal esperando que a maré subisse e voltasse a flutuar
normalmente. O mais grave de tudo isso, é que a belonave Apagou, ou seja, o turbo gerador de bordo foi desligado deixando o
navio às escuras. Convém salientar que
um navio a vapor quando o gerador apaga enfrenta um grande problema técnico
envolvendo operadores de caldeiras, maquinistas e eletricistas que conduzem o
navio.
O2- 1960- Colisão do Navio com um
cargueiro norueguês no litoral sul do Rio de Janeiro. Eu estava de serviço no
compartimento dos compressores da Frigorífica quando o navio sacudiu
violentamente e com o choque, segui-se uma grande correria no corredor que
vinha das cobertas de proa. Foi dado alarme com o toque de postos de combate.
Guarneci a terceira lancha que estava de prontidão, pois possivelmente teria
caído gente no mar. O navio com as máquinas paradas ficou a mercê dos balanços
de través, e na tentativa de se lançar a lancha nágua fui vítima de um acidente no
convés. O Barroso fez balanço de mais de vinte graus de banda. No choque, a proa
do navio entrou por mais de quinze metros.
O3- 1961- Incêndio
na Bravo três, praça de caldeiras, com o navio docado no dique Rio de Janeiro.
Foi um dos maiores acidentes com o velho barco. O fogo começou no porão da Bravo-3
e sem controle cresceu rapidamente. O navio estava inoperante no dique, e para
agravar a situação o fundo do barco estava aberto para reparos no casco perto
da quilha. Aventou-se a possibilidade de alagar o dique. Outro fato que
preocupou bastante é que o fogo se alastrou rápido e subiu para o terceiro piso
onde ficava a Contadoria, e lá
estava todo o dinheiro do pagamento da guarnição. Naquela época o pagamento era
feito em espécie. O fogo durou cerca de quatro horas. O corpo de bombeiros do
Arsenal de Marinha, requisitou os bombeiros da cidade do Rio de Janeiro para ajudar a debelar
as chamas que subiam pelas chaminés. Muita gente ficou intoxicada pela fumaça e
era atendida no prédio do AMRJ. O incêndio foi notícia nos jornais do Rio de Janeiro.
Boas lembranças
O4- 1960- Viagem de representação a Lisboa, Portugal, tendo a bordo
Excelentíssimo Senhor Presidente da República Dr. Juscelino Kubistchek de
Oliveira. O embarque do presidente e sua comitiva se deu na praia de Sezimbra
Portugal. Com o pavilhão presidencial no tope do mastro, o velho barco largou direto
para Lisboa navegando cerca de cinco horas até a entrada do rio Tejo. Naquela
oportunidade o Glorioso Barroso com todas as caldeiras acesas desenvolveu 26
knots por hora. Vi de perto o Presidente
como também suas filhas, Márcia e Maristela. Um destacamento de marinheiros e
fuzileiros navais do navio desfilou na Avenida da Liberdade em Lisboa com muito
garbo. Impressionante foi o desfile naval
na costa portuguesa onde trinta e duas nações estavam representadas. Terminado
o desfile dos navios, foi dada liberdade de ação e mais uma vez o nosso barco
fez uma bela corrida acima de 26 knots por hora. Todo o pessoal de caldeiras e
máquinas estava em Detalhe Especial para
o Mar. Guarneci o túnel do eixo de vante de bombordo junto com outras praças
observando a temperatura dos mancais de escora face à alta rotação exigida nos eixos.
No mar aberto uma fileira de navios de combate e outra fileira de navios
veleiros. Entre essas fileiras passava um Transatlântico português com os
presidentes de Portugal Professor Oliveira Salazar e o presidente do Brasil,
Dr. Juscelino Kubstcheck em postos de continência.
Relembro que o barco estava com 1200 pessoas a
bordo sob o comando do CMG, Antonio Augusto Cardoso de Castro. Pela primeira
vez peguei em Dólar e senti a sua força nas compras que fiz no comércio lusitano.
Nas comemorações do quarto centenário da morte do Infante Don Henrique estavam 32
marinhas representadas.
Política de Boa Vizinhança
05- 1960 - O primeiro porto fora do
Brasil foi Las Palmas de Gran Canária, Espanha, onde aproveitei para fazer
amigos de forma inusitada. Com permissão do Imediato do navio levei cinco
quilos de café para terra, pois sabia que na Europa o produto brasileiro era
muito apreciado. Junto com um amigo de bordo, o CB-MA Sales, sorteamos
aleatoriamente uma casa em um bairro distante da cidade. A família agraciada
nos recebeu muito bem e aceitou de bom grado o precioso café brasileiro que
ofertamos. Essa forma inusitada de apresentação nos levou a conhecer os principais
pontos turísticos da cidade, entre os quais a Cratera de La Bandama a 2000
metros de altitude e a casa de Cólon. Ficamos por muito tempo amigos da Família Rojas.
O segundo porto foi à cidade de
Cádiz, no sul da Espanha perto do estreito de Gibraltar atraindo muita gente no
cais do porto. O povo muito curioso nos cercava de perguntas sobre o Brasil e
principalmente sobre o Crucero
Barroso, um Buque fantástico. A
cidade de Cádiz de mais de 800 anos era de uma beleza singular com seu casario
medieval. Por toda a cidade tinha marinheiros do velho barco. A playa de La Vitória na Baia de Cádiz
estava apinhada de turistas e moradores do lugar e nós marinheiros impressionados
com o serviço de bar nas areias com garçons uniformizados era pra nós
brasileiros uma grande novidade, era tudo alegria. Um fato digno de nota adveio
do passeio na praia quando observamos que as banhistas (mulheres) ao sair da
água tiravam a parte de cima do Biquíni para enxugar os seios, coisa que não se
via aqui no Brasil. Foi o suficiente para a guarnição em peso voltar às areias daquele
balneário no dia seguinte.
Por via terrestre fomos à cidade de
Sevilha região da Andaluzia. Como as demais cidades européias, Sevilha também muito
antiga de casas seculares com um grande número de referências impressionantes:
Plaza de toros, os dançarinos Flamengos e principalmente a monumental Catedral
de Sevilha.
Rotina de Sexta Feira
Relembro da Rotina de Sexta Feira quando a marujada com uma sandália feita de
mangueira de lona esfregava o convés com areia na cadência da banda de
Fuzileiros Navais tocando hinos e dobrados militares. Outra coisa que ficou marcado
era quando a guarnição nas horas de lazer se concentrava no grande
compartimento apelidado de Lapa para bate papo e lazer.
Presenciei
um fato interessante na Praça de Máquinas- Chalie- II, quando eu estava
carregando o grupo de Ar Comprimido de 4000 libras que serviria para abrir os
cilindros de recuo dos canhões de 152 mm. Um segundo tenente recém embarcado, com cara
de menino, era assessorado por oficiais superiores e com muita reverencia
contrariando o que aprendi sobre hierarquia. Descobri depois que aquele segundo
tenente era descendente direto da família real. O boy era um Orleans e Bragança
06-1976- Para encerrar, presenciei um
fato lamentável no cais sul do AMRJ, isso em 1976, quatorze anos depois de ter
desembarcado do Cruzador. Eu estava fazendo pesquisa sobre refrigeração para o
curso de aperfeiçoamento de MO no Arsenal de Marimha na Ilha das Cobras.
Emocionado subi a prancha do Velho Barco que já estava desativado. No portaló
não tinha mais Oficial de serviço, Contramestre nem Ronda. Apenas um grupo de
conservação estava a bordo e um bom número de Maçariqueiros cortando com fogo
os canhões históricos da torre três. Que pena!
Passagem da Linha do Equador
Na travessia Rio de
Janeiro Las Palmas o navio fez uma estada no então Território Federal de
Fernando de Noronha para compensação da agulha. Na oportunidade um helicóptero de
bordo sobrevoou a Ilha com mensagem do comando de bordo. O navio largou para a
Europa com seus 1200 homens a bordo cruzando a linha do equador acima dos
rochedos de São Pedro e São Paulo onde se procedeu a festa de batismo dos neófitos que invadiram os domínios do
Rei dos mares, senhor dos ventos e das tempestades, o Rei Netuno. O meu nome de batismo foi do peixe Pargo. Foi um acontecimento marcante no
meio de tanta gente embarcada. Na popa, foi improvisada uma grande piscina de
lona onde os calouros eram jogados pelos “carrascos” da guarda de Netuno. A bandeira
da caveira, símbolo dos piratas, ficou hasteada no mastro principal do Glorioso
Cruzador Barroso até o fim da brincadeira. Ainda na travessia o navio prestou
homenagem póstuma aos mortos do Cruzador Bahia na segunda guerra mundial na Estação 13.
Natal, Junho de 2007
Mário de
Araújo Monteiro.
Congratulo-o pela iniciativa de "Casos de Marinha", pois, eu também tive a honra de embarcar nessa grande e inesquecível nave, o nosso querido Charlie 11, o Cruzador Barroso, que um dia pertenceu à gloriosa Marinha de Guerra. Tomei parte da guarnição do Barroso a partir de 1968, assim que saí da Escola de Aprendizes de Marinheiro de Pernambuco, Turma Golf (1966-1967), cujo comandante era o capitão-de- fragata Murilo Souto Maior de Castro. Estive presente na lamentável tragédia da Praça de Máquinas, quando singrávamos as águas do litoral baiano rumo ao Rio de Janeiro, o nosso 1.o Distrito Naval, minutos depois de eu ter passado a incumbência de "vigia de proa" a um de nossos companheiros. Pertencíamos à Primeira Divisão. Como sou jornalista (aposentando), escritor, já cogitei de escrever um livro sobre ocorrências internas a bordo do cruzador, fatos emocionantes, curiosos, jocosos (e até "sobrenaturais") afora as nossas aventuras durante as atracadelas em portos brasileiros e estrangeiros. Por favor, transmita-nos mais informações, mais experiências pessoais e tudo o que for pertinente. Um grande abraço!
ResponderExcluirgostaria de saber se vc conhecia algum Anibal alfredo Farias na tripulação
ExcluirMeu pai (Walter Santos) também foi da turma Golf 66-67 e também estava a bordo no Barroso quando ocorreu a explosão.
ExcluirFui da turma OSCAR de Santa Catarina e meu primeiro embarque foi o Barroso e estava lá quando ocorreu o acidente.Foi turista ver nossos companheiros morrerem ali na nossa frente inclusive um colega nosso chamado Custodio da nossa turma OSCAR 1966
ExcluirEmbarquei em 1958, estive nesta viagem à Portugal, Festejos Henriquinos como guarda-da-bandeira Nacional, e presente na inauguração do Monumento aos Descobridores, às margens do Rio Tejo.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluir????
ExcluirCruzador Barroso-Guardião dos Mares.
ResponderExcluirautor: Pedro Alquati, ex-tripulante.
Editora: www.allprinteditora.com.br
Embarquei em 1966 e estava a bordo quando explodiu e morreram mais de dez companheiros
ResponderExcluirMeu marido está abordo navio época explosão das cadeiras era EP chagas filho .
ResponderExcluirMeu marido estava a abordo navio época explosão das cadeiras era EP chagas filho .
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